sexta-feira, 3 de maio de 2019

Comenos XVI - Futuro sem precipício - Comenos Helenísticos Heleno Pinhal 2003


Difamam o desenvolvimento do homem com os seus frutos a refrescar-lhes a pele – e depois dói e deixa vestígio por dentro e por fora. São umas ingratas árvores de natal sempre a dizer mal dos seus enfeites.
Para afastar o progresso, acendem velas ao passado muito concentrados nos poderes de certas orações.
Há várias preces para as diferentes descobertas: A guerra de nada serve; o aborto só por deus; a clonagem é eugenia. Como se o inerente desejo do homem em zelar pela sua linhagem não fosse lícito fora da banalidade. Como se ter um filho, igual ao próprio, não pudesse ser concretizado sem fluidos e suores. Como se o elogio “é a cara do pai” se desvanecesse, caso o progenitor recorra a frascos para criar um ser humano.
O presente não é um precipício porque o futuro existe.
Vorazmente, essas ingratas árvores são embrulhadas na petrificação temporal dos homens, a doença que só a morte leva. Leva e leva bem os velhos de espírito que deixam a sua semente reacionária ao cuidado de irresolutos sem capacidade de conhecer ou e muito menos de compreender.
Eu vou. Percebi que só evoluo se me desligar do que é caseiro, obsoleto, habitual e negativo.
Sinto um aperto cá dentro quando ouço orações irrefletidas para fora. A preces deste tipo respondo com uma que criei e prenúncio, em tom suave de elegia, no final de dissertações retrógradas:
Espero que tanto papismo não me tire dez anos de vida, quando não existir aquele chip, que encaixa naquela máquina, que cura aquela doença.
É uma falácia afirmarem que o futuro é um precipício, um lugar intrincado de calamidade e insucesso.
Quero afastar a imperícia da sociedade em que estou mergulhado, quero parar ao ver na calçada estenderem a farroupilha e quero também sentir o sol pela manhã, porque assim como me regozijo, também me constipo, sangro e rejeito saindo tudo deste meu singular peito.

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