quinta-feira, 27 de setembro de 2018

IV. Cigarro mal cheiroso - Covilhã Viperina

Deixei de fumar. Deixei este vício colado ao tronco de uma árvore que me abrigou. Chovia muito por detrás do que eu não queria ser. Não cheirava o perfume matinal dos cabelos cuidados das mulheres primorosas que sangravam a sua lubricidade deliberadamente nas minhas mãos. Só para me verem derretido!


Os vícios elevam-se de propósito por quem os cria, não são sequelas do ócio ou da imaturidade.
Deixei de fumar como deixei os legos infantis. Uma sopa mal metida, cansada por falta de sabor.

Um cigarro bem fumado dá vida a quem a procura, o seu potencial efetivo supera os outros já estudados. Fuma-se um, depois há outro. Quero saber. Saber o exato local para acender a toxina como se fosse uma pincelada de pescador. Aquece se faz frio e arrefece os nervos que se soltam nos tremores de qualquer vida. Escolhe-se qualquer sabor. A vida oferece os seus frutos sem pedir nada em troca. A força empregue para este desleixo sai pelos dedos de todos os poros. Acendo um, depois virá outro, sem receios, até ao enegrecer das águas na sua fonte. Sujar tudo assim sem conceitos preformados?

Ao saborear o ar limpo alguém se queimou no mais sujo. Diz lá como foi. É que sem ver não posso crer. Diz aos ouvidos mais abertos que o ar sujo é para os potes mal pensados, para os bobos desenterrados da ilusão da juventude. Junta argumentos com palavras, numa frase com propósito. Continua a deixar-te levar, sem barragem nem mar alto, que o sopro passa a tempestade.

A imperícia de qualquer vento pode ser perigosa se o desleixo comparecer nesta cúpula de amores.

2003, Novembro, 12, 00:32:07, Covilhã

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